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A
Herança
Quando somos criancas o mundo é cor-de-rosa e temos tudo para
aprender, nem nos damos conta de como somos felizes. Cada dia é uma
descoberta e cheios de amor vamos crescendo e perdendo a inocência.
Com a orientação de um Pai e o amor de uma Mãe vamos ser adultos
capazes de dar amor ter filhos e vê-los crescer...... Bem... para
mim nao foi assim tão facil.
Quando tinha 7 anos percebi que o meu Pai
não era como os outros pais, era muito magro, andava com dificuldade, o
pouco que comia fazia-lhe mal tinha diarreias constantes era incontinente
e nao distiguia o calor e o frio nas mãos e nos pés. Foi
nesta altura que fiquei a saber que o meu pai sofria de
Paramiloidose.
Doença Portuguesa e antiga que acompanhou
os nossos marinheiros nas descobertas quinhentistas, tendo assim sido
transmitida a todo o mundo. Paramiloidose, ou, mais correctamente,
Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF), ou ainda doença dos pezinhos,
são as designações porque é conhecida em Portugal uma doença de
transmissão familiar, caracterizada por alterações do sistema nervoso
periférico e autonomo, e deposição de uma substância anormal, a amilóide,
em diversos locais do organismo. A PAF
está associada, em Portugal, a uma mutação do gene da transtirretina,
razão pela qual a doença se transmite de pais para filhos. Essa mutação é
a causa da presença, no sangue, de uma transtirretina anormal, que dá
origem aos depósitos de substância amilóide.
Foram angustiantes os ultimos anos de vida
do meu Pai. Lembro-me de muita coisa que preferia conseguir esquecer ,
como estar no ciclo preparatorio a jogar a bola, e estar preocupado se
quando ia chegar a casa o meu pai estaria desmaiado ou se teria caido
outra vez. Com a maior naturalidade o meu "Pai Heroi" faleceu num
estado de extrema debilidade ,deixando-me marcas para toda a vida. No
entanto a minha sorte ja estava decidida dentro de mim desde o dia da
minha concepção apenas eu ainda não sabia. O tempo encarrega-se de fazer adormecer o passado,
cresce-se com a esperanca de nunca vir a ter tal infelicidade, por alguns
anos consegui recuperar uma certa inocência mas chega o tempo de voltar a
enfrentar tudo outra vez.
Os primeiros sintomas comecam normalmente
entre os 25 e 30 anos , altura em que o "Adulto jovem" em principio esta
ja casado e ou com filhos. Esta doença tambem acarreta problemas de
ordem social, como sofrem de incapacitação precoce são obrigados a deixar
os seus empregos sem qualquer apoio , muitas vezes são marginalizados pela
propria empresa de 1001 maneiras. Não existe qualquer especie de protecção
para estes doentes. Mais uma contrariedade para o "Adulto Jovem" que
quer dar amor ter filhos e ve-los crescer. O paciente
ao fim de alguns anos anda muito mal, com canadiana ou mesmo cadeira de
rodas, a incontinência e impotência surgem, tem diarreias constantes,
emagrece muitos quilos, nao tem sensibilidade termica, a depressão surge
como um factor resultante das alteracoes quimicas e do estado psicologico
do individuo, muitos encontram no suicidio o seu fim.
Embora na base da doença esteja uma
modificação genética, a qual o fígado se limita a responder, o que se
observou desde que a transplantação foi ensaiada pela primeira vez em 1990
foi a diminuicão imediata para valores considerados normais de HR mutante
no soro dos doentes transplantados. Sendo o transplante o unico
tratamento eficaz cabe ao estado providenciar os mecanismos para a
resolucão rapida desta operacão bastante delicada. Existem 3 hospitais em todo o pais a realizar esta
operação ( Hospital Universidade Coimbra, Hospital Sto Antonio no Porto e
o Curry Cabral em Lisboa, mas o problema da falta de orgãos faz com que as
listas de espera aumentem em tempo e infelizmente em
candidatos.
Devido a falta de informação e a alguma
irresponsabilidade por parte de alguns portadores da doença que continuam
a ter filhos mesmo sabendo o perigo que estes correm , o numero de casos
disparou nos ultimos 10 anos.... Nao se sabe ao certo quantos doentes
existem em Portugal mas somos demasiados. As pessoas tem que se capacitar que a unica maneira
de acabar com esta doença e nao ter filhos geneticamente falando,
claro!
Enquanto espero pelo transplante luto contra
esta doença todos os dias , quando me olho no espelho acontece-me ver o
rosto do meu Pai , o mesmo olhar triste e cansado, e ai percebo um pouco
do seu sofrimento agora no meu proprio corpo.
O Herdeiro
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